sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Entrevista embaixadora da Polónia

"Só o crescimento pode dar maior segurança aos cidadãos europeus" - afirma Katarzyna Skorzynska. Em entrevista à "Vida Económica", a Embaixadora da Polónia em Lisboa prevê que a atual taxa de crescimento, próxima dos 4%, se irá manter e salienta a importância das reformas estruturais para que todas as economias que perderam a competitividade possam recuperá-la.
A Polónia de hoje está distante da cultura da economia planificada e do papel dominante do Estado, quando fazia parte do ex-bloco de Leste. Pelo contrário, Katarzyna Skorzynska revela-se crítica quanto aos países europeus que elevam as despesas sociais para níveis incomportáveis, sem resultados satisfatórios, mantendo grandes desigualdades sociais.
Vida Económica - A economia polaca continua a crescer em contraciclo, apesar de conjuntura internacional desfavorável?
Katarzyna Skorzynska - Nesta Europa em crise, a Polónia continua a crescer. Em 2011 o crescimento do PIB está perto dos 4%. No próximo ano, este ritmo de crescimento deverá manter-se.
O crescimento é fundamental. Só o crescimento pode dar maior segurança aos cidadãos europeus. É muito importante realizar todas as reformas estruturais para que todas as economias que perderam a competitividade possam recuperá-la.
A nossa economia oferece boas perspetivas. Este sucesso da Polonia deve-se à política cautelosa dos bancos polacos que nunca exageram com instrumentos muito sofisticados e ao grande esforço desenvolvido pelos empresários polacos. São pessoas que sabem correr riscos de maneira bastante eficiente.
VE - Quando destaca as capacidades dos empresários, não podemos esquecer que a Polónia viveu durante dezenas de anos numa economia planificada. O espírito empreendedor não foi prejudicado?
KS - Uma economia controlada totalmente pelo Estado, como tivemos durante o regime comunista, não contribuiu para o trabalho e desempenho. Os polacos nunca gostaram deste controlo do Estado. Quando se libertaram deste regime, demonstraram enorme capacidade de organização, empreendedorismo, uma grande abertura para correr riscos. Os polacos foram muito cautelosos em relação ao endividamento, tendo um limite de dívida pública previsto na Constituição.
VE - São esses fatores que estão na origem dos resultados obtidos por alguns grupos portugueses que atingiram posições de primeiro plano no mercado polaco, nomeadamente, o BCP e Jerónimo Martins?
KS - Os resultados também se devem às grandes capacidades dos empresários portugueses, que analisaram da maneira certa as oportunidades do mercado polaco. Devem-se também ao bom nível de mão de obra polaco em termos de formação e atitude. Há entusiasmo em trabalhar e produzir. Isto é com certeza o nosso valor competitivo. Também contribuiu de forma positiva a estabilidade política e económica. Existe uma boa base para as empresas estrangeiras fazerem negócios na Polónia.
VE - Como vê o evoluir das relações comerciais entre Portugal e a Polónia?
KS - O nosso relacionamento económico é com certeza um pilar do nosso relacionamento bilateral. Isto é muito importante para o futuro das nossas relações. O comércio bilateral alcançou em 2010 o valor 805 milhões de euros. Apesar de já termos uma presença significativa das empresas portuguesas na Polónia, poderá fazer-se muito mais. Acho que ainda se podem promover as relações entre as pequenas e médias empresas polacas e portuguesas. O forte investimento português nos meados dos anos 90 foi só das grandes empresas portuguesas que tiveram recursos para preparar uma estratégia de entrada no mercado polaco. Também há espaço para as pequenas e médias empresas tanto no investimento como na exportação para o mercado polaco. As privatizações a nível local e regional abrem novas oportunidades. A nossa ideia é promover a cooperação entre as pequenas e médias empresas e entre as regiões.
No âmbito da presidência polaca da União Europeia lançámos as conferências regionais em várias cidades de Portugal para favorecer a aproximação das empresas locais.
VE - Em que setores de atividade há mais oportunidades para aumentar as exportações para a Polónia?
KS - Tendo em conta o grande sucesso dos produtos polacos em Portugal e o grande sucesso de alguns produtos portugueses na Polónia, acho que há um grande espaço no setor alimentar para ambos os lados. Nesta área o volume de negócios em 2010 caiu um pouco, também por causa da crise e algumas dificuldades dos importadores portugueses. O mercado polaco pode ser também importante, por exemplo para o vinho do Porto. Ainda é pouco conhecido na Polónia porque no passado não entrava nos hábitos dos polacos, mas já desperta grande interesse.
Os vinhos portugueses têm muito sucesso quando comercializados pelas lojas e por alguns importadores privados. É um grande mercado de 40 milhões de pessoas, que cada vez mais apreciam um bom estilo de vida e que cada vez mais visitam Portugal. Já há hotéis no Algarve onde os polacos representam o terceiro grupo entre os turistas estrangeiros.
Tem havido uma boa promoção de Portugal nos jornais polacos e os voos diretos da TAP ajudam a desenvolver este intercâmbio.
VE - Uma das áreas possíveis de cooperação é a de energia. A Polónia tem um projeto importante na substituição da fonte de carvão por outras fontes, incluindo o nuclear. O acidente do Japão veio alterar os planos?
KS - A decisão de construir duas novas centrais nucleares mantém-se. Queremos desenvolver a energia nuclear e também temos interesse em desenvolver energias renováveis. Estamos a fazê-lo com a energia eólica, a biomassa e o biogás. É difícil passar do modelo de produção de energia elétrica baseada no carvão, no caso da Polonia, que representa 90% da produção de eletricidade para as energias renováveis, sobretudo por causa dos custos. O nuclear faz parte de uma solução sustentável, tanto do ponto de vista dos consumidores como dos produtores da energia elétrica.
É óbvio que faremos um grande esforço para desenvolver as energias renováveis e a economia verde. Também pretendemos aumentar a produção de biocombustíveis.
VE - Acha que a Polónia, através da presidência da União Europeia, pode dar um bom contributo à solidariedade e à defesa do projeto europeu?
KS - Para nós, o projeto europeu é fundamental porque entrámos para a UE em 2004. A União Europeia era o nosso objetivo, por isso faremos tudo para desenvolver este projeto. A nossa presidência fez um grande esforço para trabalhar junto com outras instituições europeias, com a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu para negociar soluções e assegurar a base necessária de combate a crise.
VE - Se não for viável uma Europa a 27, e a Europa se polarizar em várias regiões, a Polonia tenderá a ficar mais ligada à Alemanha?
KS - A Alemanha é um parceiro importante, mas a Europa é tão pequena. Não nos podemos concentrar em blocos específicos dentro da União Europeia. Temos de ter um sólido mercado interno de todos os países da União Europeia, onde as empresas possam competir.

Tradição de política social de Portugal pode ser adaptada à realidade atual
Na União Europeia existe uma visão mais tradicional quanto ao papel do Estado e da Europa fortaleza e uma visão mais aberta e favorável à cooperação com os Estados Unidos.
Katarzyna Skorzynska considera que a Polónia e os países que formavam o ex-bloco de Leste estão mais próximos da visão atlantista - é uma "realidade geopolítica que é um fator objetivo".
"Com o crescimento das grandes economias fora da Europa este modelo fechado é impossível de desenvolver. Acho que a crise pode ter também este efeito positivo, no sentido de adaptar as soluções europeias à situação global. Não poderemos manter este nível de políticas sociais nas várias áreas se queremos competir com as outras economias".
"É possível desenvolver os instrumentos que podem combater a exclusão social. Isto é muito importante e Portugal também tem uma longa tradição de política social que pode ser adaptada à realidade atual. Exige um trabalho a longo prazo para se analisar quais são os instrumentos adequados para se conseguirem bons resultados. Há países onde, apesar das políticas sociais desenvolvidas, as desigualdades sociais são muito grandes. Investiu-se muito dinheiro mas não se conseguiu um maior equilíbrio no desenvolvimento humano", conclui.
Fonte: www.vidaeconomica.pt 

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